domingo, 27 de maio de 2012

A Igreja em Laodicéia: O retrato de uma comunidade cristã indiferente e presa ao seu bem-estar!


Teatro em Laodicéia
Por Gutierres Fernandes Siqueira

O conforto, a riqueza e o bem-estar são ótimos. Quem não os deseja? Vivemos em uma nação que emerge entre as mais ricas do mundo. Motivo de alegria? É claro. É crescente a classe média que compra carros, geladeiras, serviços e viaja pelo mundo. Oh, que maravilha! E as igrejas? Estão cada vez mais ricas! Os templos são confortáveis e enormes. Há ar-condicionado, berçários e estacionamentos que lembram os grandes shoppings-centers. Mas com toda essa riqueza crescente aproveitamos para viver uma fé mais intensa ou somos movidos pela “indiferença preguiçosa” que é a tentação do bem-estar?

A mitologia grega apresenta vários homens que foram punidos pelos deuses por causa do pecado conhecido como húbris. Em sua autossuficiência os homens esqueciam de seus limites e desafiavam os deuses, mas não ficavam sem punição de sua insolência, arrogância e confiança excessiva produzida pelo poder e riqueza que desfrutavam. “Podes observar como a divindade fulmina com os seus raios os seres que sobressaem demais, sem permitir que se jactem da sua condição; por outro lado, os pequenos não despertam as suas iras. Podes observar também como sempre lança os seus dardos desde o céu contra os maiores edifícios e as árvores mais altas, pois a divindade tende a abater todo o que descola em demasia”, dizia o historiador grego Heródoto.

A Torre de Babel é uma história bíblica que mostra como a arrogância de um povo acabou em “confusão de línguas”. Eles, em sua arrogância, queriam ser deuses. Queriam como o “cume da torre” tocar os céus (cf. Gênesis 11.1-9). O que vale uma grande construção sem a base em Deus? “Se não for o Senhor o construtor da casa, será inútil trabalhar na construção. Se não é o Senhor que vigia a cidade, será inútil a sentinela montar guarda” (Salmos 127.1). E ainda lembra o salmista: “Alguns confiam em carros e outros em cavalos, mas nós confiamos no nome do Senhor nosso Deus” (Salmos 20.7).

A Igreja em Laodicéia

O nome Laodicéia significa “justiça do povo” ou “povo justo”. Era uma cidade riquíssima. Havia ali um intenso comércio de madeira, produção de lã e uma indústria avançada, logo porque a cidade ficava no entroncamento de três estradas importantes e entre terras férteis. Laodicéia foi a sede de uma grande escola médica e era um importante distrito político que representava mais de vinte cidades e onde os julgamentos eram realizados. O grande filósofo Cícero mantinha a sua corte nessa cidade. As inscrições arqueológicas a descrevem como “metrópole”.  A divindade tutelar da cidade era de Zeus (Júpiter). Daí o seu nome anterior Diospolis ou Cidade de Zeus. O povo de Laodicéia era culto e apreciava a arte, a ciência e a literatura grega. Como Laodice era um nome comum entre as mulheres da casa real da Selêucidas, o nome foi dado a várias cidades na Síria e Ásia Menor. “É agora um lugar deserto chamado pelos turcos ‘Eski-Hissar’ ou ‘velho castelo’”, como descreve o Easton's Bible Dictionary.

A demonstração da riqueza de Laodicéia ficou evidente no ano 60 d. C. quando um grande terremoto destruiu toda a cidade, mas os habitantes rejeitaram a ajuda de Roma e reconstruíram sozinhos a cidade. Além disso, os habitantes da cidade ajudaram outras cidades atingidas. A cidade também era um importante centro bancário, ou seja, um lugar onde havia intensa troca de moedas. Assim como a cidade era rica a igreja em Laodicéia era também riquíssima em bens materiais. No texto bíblico não menciona nenhuma perseguição à igreja promovida pelo Império Romano ou judeus e nem houve ameaças de falsos profetas. Mas ainda assim a igreja em Laodicéia é a pior. Não recebe do Senhor nenhum elogio.

A fidelidade do Amém e a inconstância da igreja

O Senhor sempre se apresenta para a igreja conforme a sua necessidade. Deus, ao contrário da pregação contemporânea, não fala o que o povo quer ouvir, mas sim o que precisa ouvir. Portanto, Cristo se apresenta como o fiel, o “Amém” como nome próprio (v.14). É aquele que faz o que afirma. É a excelência da sinceridade. Ele não somente fala a verdade, como é a própria Verdade. É justamente o contraste de uma igreja morna, indiferente e escondida em uma máscara de riqueza e glória terrena.

Marvin R. Vincent  escreveu em Vincent's Word Studies: “Apenas nesse texto é usado como um nome próprio. Veja Isaías 65.16, onde a tradução correta é “o Deus do Amém”, em vez de “Deus da verdade”. O termo aplicado para o Senhor significa que Ele mesmo é o cumprimento de tudo o que Deus falou para as igrejas”. O termo “amém” é a forma do Senhor de dizer que Deus é fiel.

O termo grego αμην (amḗn) traz a ideia de firmeza e fidelidade. “A ideia expressão por esta frase não é de que Deus é o Deus verdadeiro em contraste com deuses falsos, mas que Deus é fiel, que podemos confiar nele, que ele cumprirá o acordo que fez com seu povo”, como escreveu George Ladd [1]. “Uma vez no Novo Testamento encontramos ‘amém’ como título de Cristo (Ap. 3.14), porque por meio dEle os propósitos de Deus são estabelecidos (2 Co 1.20)” [2].

A expressão “testemunha fiel e verdadeira” (ho martys ho pistos kai ho alēthinos) é, digamos, a tradução do substantivo Amém. A expressão poderia ser traduzida como “testemunha confiável e legítima [3]”. Em Cristo não há falsa espiritualidade escondida em máscaras. Em Cristo não há aparência de vida, mas sim vida verdadeira. Em Cristo não há motivos para desconfiança, pois o seu caráter é imutável e firme. O compositor Thomas Obediah Chisholm expressou de forma linda a fidelidade de Deus no hino Tu és Fiel, Senhor:

Tu és fiel, Senhor, meu Pai celeste:
Pleno poder aos teus filhos darás. 
Nunca mudaste: tu nunca faltaste:
Tal como eras, tu sempre serás.

Quando falamos de fidelidade falamos de verdade. Somos o que dizemos que somos? Vivemos de aparências? Era o que acontecia com essa igreja morna. E é o que acontece com muitos de nós nos dias de hoje. A hipocrisia sempre foi um pecado bem presente na aparência de religiosidade. E talvez seja o pecado mais fácil de ser praticado por todos aqueles que vivem em um “ambiente religioso”. O pastor Antonio Gilberto escreveu:

Poderíamos nos perguntar: “Minha fidelidade a Deus é tão confiável quando sua fidelidade a mim? Estou revestido de fidelidade? Cumpro minhas promessas a Deus? Sou fiel em expressar o meu amor por Ele e cumprir meus votos? Sofro pacientemente e de boa vontade por causa do Evangelho? Sou mordomo leal e consistente? Deus pode me confiar o tesouro que ele pôs em minhas mãos? Estas são perguntas importantes que deveriam nos motivar a ser mais fiéis [4].

A fidelidade é uma virtude do Espírito Santo. É o fruto que Ele quer trabalhar em nossas vidas (cf. Gálatas 5.22).



(fi.de.li.da.de) sf.
1. Qualidade ou atributo de quem é fiel
2. Qualidade, atributo ou caráter do que é fiel à veracidade ou à representatividade de algo, ou à verdade dos fatos (fidelidade do resultado): Contestou a fidelidade da tradução
3. Respeito aos compromissos assumidos ou ao vínculo com alguém ou algo (fidelidade à causa; fidelidade partidária): Sempre acreditou na fidelidade do irmão.
4. Compromisso ou respeito ao compromisso (assumido com pessoa com a qual se mantém relação amorosa) de sinceridade, reciprocidade e esp. de não envolvimento amoroso ou sexual com outrem (fidelidade do marido; fidelidade da namorada)
5. Constância, firmeza, perseverança. [ antôn.: Antôn.: inconstância; volubilidade. ]
[F.: Do lat. fidelì tas, a tis. Ant. nas acps. de 1 a 4: infidelidade.]   
fonte: Dicionário Aulete


Quem é o Soberano?

Soberano não é quem pensa que “de nada tenho falta”, mas sim o Criador de tudo o que existe. Cristo, em sua apresentação ainda mostra que Ele é o Criador junto com o Pai e o Espírito Santo (Jo 1. 4-9; Cl 1.15,16; Hb 1.2,10) e que Ele possui autoridade sobre a criação (Mt 28.18; Cl 1. 16-18; Hb 2.8). A igreja em Laodicéia estava esquecendo em sua arrogância e autossuficiência quem era o Soberano.

Jesus é o “princípio da criação de Deus”, ou seja, Ele é a origem da criação porque “todas as coisas foram feitas por intermédio dele” (Jo 1.3). A centralidade está em Cristo e não no “eu”. Nada é suficiente diante de Cristo. Nada é comparado ao Senhor. A igreja que esquece da centralidade de Cristo e de seu poder simplesmente caminha para a morte espiritual.


Como Cristo se apresenta para uma igreja com graves defeitos?


Cristo como o Amém (o Fiel e Verdadeiro)Cristo como Soberano da criação
Igreja indiferente e não compromissadaIgreja autossuficiente e arrogante


Igreja Morna!

Portanto, a igreja estava morna. Assim como as águas térmicas eram transportadas para Laodicéia e chegavam mornas na cidade, assim era a igreja daquele lugar. Uma igreja que vivia de professar aquilo que não sentia. E pior: não reconhecia o seu erro. Estava cega e precisava do colírio do Senhor.

Ou reconhecemos que nada somos e que sempre precisamos do Senhor ou viveremos da arrogância de Laodicéia. Em tempos de ufanismo e triunfalismo essa carta é como um grito forte e ressonante.

Referências Bibliográficas:


[1] LADD, George. Apocalipse. Introdução e Comentário. 1 ed. São Paulo: Edições Vida Nova, 1980. p 50.

[2] VINE, W. E.; UNGER, Merril F. e WHITE Jr., William. Dicionário Vine: O Significado Exegético e Expositivo das Palavras do Antigo e do Novo Testamento. 1 ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2002. p 394.

[3] A maior parte dos tradutores preferem usar o termo “fiel” do que “confiável” para referir-se a Deus.

[4] GILBERTO, Antonio. O Fruto do Espírito. 1 ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2004. 117.

Bibliografia:

JAMIESON, R. Jamieson, Fausset, and Brown's Commentary On the Whole Bible. 1 ed. Grand Rapids: Zondervan, 1999.

VICENT, Marvin R. Vincent's New Testament Word Studies. 1 ed. Peabody: Hendrickson Publishers, 2009.

_ Bíblia de Estudo Palavras-Chave Hebraico e Grego. 1 ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2011.









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