A idéia do amor de Deus não é com certeza nova com Jesus. Na verdade, não é nem mesmo exclusividade da tradição judaico-cristã. Outros homens, em outras épocas, em outras partes do mundo, pensaram ou esperaram ou desejaram que o realmente real, o Deus vivo, de fato os amasse. Jesus, porém, acrescentou uma nota de confiança. Ele não disse que Deus talvez fosse amor, ou que seria legal se Deus fosse amor. Ele disse: Deus é amor — e ponto final. Há, porém, mais na mensagem de Jesus. Ele insistia que seu Pai está louco de amor, que Deus é um Deus apaixonado que não consegue ficar sem nós. A parábola que deixa essa verdade mais evidente é a do filho pródigo, a parábola do Pai amoroso.
A ênfase não está na pecaminosidade do filho mas na generosidade do Pai.
Deveríamos reler essa parábola periodicamente para capturarmos as delicadas nuances do primeiro encontro entre os dois. O filho havia ensaiado o seu discurso cuidadosamente. Era uma declaração elegante e elaborada de pesar. Mas o velho não o deixou terminar. O filho mal chegou à cena quando um manto requintado é atirado sobre seus ombros. Ele ouve música, o bezerro cevado está sendo levado para o salão, e ele não chega nem mesmo a ter a oportunidade de dizer a seu pai: "sinto muito".
Deus nos quer de volta mais do que jamais seríamos capazes de desejar voltar. Não temos de entrar em detalhe sobre o nosso pesar Tudo que temos de fazer, diz a parábola, é aparecer em cena, e antes que tenhamos uma chance de fugir novamente, o Pai nos agarra e arrasta para o banquete de modo que não tenhamos como escapar.
Há uma fascinante passagem no capítulo 8 do Evangelho de João sobre uma mulher apanhada em adultério. Lembre-se do modo como a multidão arrastou-a até diante de Jesus e perguntou:
— O que fazemos com essa mulher? Ela foi apanhada em adultério. Moisés diz que devemos apedrejá-la, mas os romanos não nos deixam apedrejar as pessoas. Qual é o seu parecer?
Jesus os ignora e começa a escrever na areia. Ele então levanta os olhos e diz:
— Bem, aquele aqui que não cometeu pecado algum atire a primeira pedra.
Um a um eles se afastam. Jesus então diz à mulher:
— Não restou ninguém aqui para condená-la?
— Ninguém, Senhor — ela diz.
— Tudo bem — ele diz. — Pode ir e não cometa mais esse pecado.
Agora entenda: Jesus não perguntou se ela estava arrependida. Ele não exigiu um firme propósito de reforma moral. Ele não demonstrou preocupação de que ela poderia ir correndo atirar-se de volta nos braços do seu amante. Ela só ficou ali e Jesus deu-lhe absolvição antes que ela pedisse.
A natureza do amor de Deus é ultrajante. Por que esse nosso Deus não demonstra algum bom senso e moderação quando lida conosco? Por que ele não demonstra mais autocontrole? Para ser direto, será que Deus não poderia ter um pouquinho mais de dignidade e de amor-próprio? Puxa vida!
Agora, se fossemos nós na posição dele, saberíamos exatamente como agir — aquele filho pródigo teria recitado seu discurso até a última palavra. Quando ele terminasse, nós diríamos:
— Muito bem. Agora vá embora, filho pródigo, e vou pensar a respeito por umas duas semanas. Você será então informado via correio se decidi admiti-lo ou não de volta na fazenda.
Não creio que alguém teria aprovado que aquela pobre mulher adúltera fosse apedrejada, mas pode crer que teríamos nos certificado de que ela oferecesse uma detalhada manifestação de contrição, e um firme propósito de corrigir-se. Se a dispensássemos sem que ela pedisse desculpas, não era certo que ela reincidiria em adultério antes do entardecer?
Não, o amor de Deus não tem dignidade nenhuma, e aparentemente é assim que ele espera que seja o nosso amor. Ele não apenas requer que aceitemos sua espécie inexplicável e embaraçosa de amor, mas, uma vez que o aceitamos, ele espera que nos comportemos do mesmo modo com os outros. Acho até que seria capaz de sobreviver, se fosse obrigado, com um Deus cujo amor por nós fosse embaraçoso, mas a idéia de que tenho de agir da mesma forma com as outras pessoas — isso é demais para engolir.
Talvez o modo mais simples, embora certamente não o mais fácil, de começar seja comigo mesmo.
Faça então por você mesmo o que faria pelos outros. E aquele saudável amor próprio que Jesus prescreveu quando disse "ama teu próximo como a ti mesmo" poderia começar com o simples reconhecimento: qual é a história da minha vida? é a história de uma pessoa infiel através da qual Deus continua trabalhando. Essa é a idéia!!!!
Juliano Fabricio
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